Na newsletter da semana passada apresentamos um breve relato (da história econômica) de como o dólar se tornou não somente a moeda dos EUA, mas a moeda do mundo. No entanto, como argumentamos, tal relato não deu destaque a um player fundamental na arquitetura geral do sistema monetário internacional: o “Eurodollar Market”, ou seja, o mercado de dólares depositados fora do sistema bancário dos EUA.
Um dos mercados menos entendidos do mundo é o Eurodollar Market (que não diz respeito à moeda do Euro, nem às transações envolvendo o Euro e o Dólar no Mercado FOREX – Foreign Exchange Market). Mas o que é o Eurodollar Market? Como antecipado acima, é o mercado de qualquer dólar que é depositado em um banco fora dos EUA.
Sua origem está relacionada aos desenvolvimentos financeiros nos anos 1950 e 1960s, logo após a fundação do conhecido “Bretton Woods System”, a partir da “Bretton Woods Conference” de 1944, que tornou o dólar como a moeda de reserva do mundo. Na essência esta conferência foi também um acordo, por tratado, para que o dólar resolvesse todo o comércio internacional, o que definiu o caminho para uma grande necessidade de dólares.
Como apontado em (1), a primeira iteração do Eurodollar Market se materializou na forma de uma Bankers Acceptance Note (Note), a qual era essencialmente um Certificado de Depósito, denominado em USDs (dólares americanos), que permitiu que duas nações estrangeiras transacionassem entre si, tão eficientemente quanto possível. Exemplo: Japão deseja comprar bens da Suécia, logo eles pegam seu Yen, compram uma Note denominada em USD, daí comercializam aquela Note com a Suécia em troca por bens. A Suécia podia então, trocar a Note por seus Krona domésticos.
De forma simplificada, essas eram transações que estavam acontecendo, convertendo uma moeda estrangeira em USDs para facilitar o comércio. O mistério, no entanto, é que não há um entendimento da evolução desse sistema de trocas, para onde ele está hoje, com dólares em depósitos fora dos EUA.
Todavia, as Notes são certificados que alguém efetivamente “compra” dos EUA e as usa como moeda ou collateral (garantia) para o comércio, sem que os USDs saiam dos EUA. Eurodollars, ao contrário, são reservas em USDs em países estrangeiros que efetivamente removem a necessidade de “comprar” certificados dos EUA, à medida que alguém poderia simplesmente usar USDs disponíveis para troca de bens. O que isso significou é que não havia mais a necessidade de troca de cash (dinheiro) adiantado para essas coisas funcionarem (como o exemplo do Japão e a Suécia).
Isso era uma solução mais elegante e eficiente (apesar de não intencionada) para um problema incômodo (países estrangeiros transacionando em moedas não-domésticas). Como feito com a Note, o Eurodollar Market primeiramente, e acima de tudo, preencheu uma necessidade para mecanismos de ajustes de liquidez comum no comércio global, mas de um modo eficiente.
Depois da Segunda Guerra Mundial, quando as economias em recuperação (com ajuda dos EUA) começaram a acumular em USDs, alguns países preferiram não repatriar os USDs através de bancos americanos; ao invés, retiveram tais USDs “off-shore”, primariamente em bancos baseados em Londres fora do alcance do governo dos EUA. Ao longo do tempo, um mercado de empréstimos se desenvolveu ao redor desse pool de fundos. Banqueiros ingleses começaram a se referir às taxas de empréstimo deste mercado como a London Inter-Bank Offer Rate, também conhecida como LIBOR (2).
O desenvolvimento deste Eurodollar Market, junto com outras inovações financeiras nas últimas décadas, tem impulsionado o Sistema Monetário Internacional a constituir uma arquitetura extremamente complexa e muito pouco entendida. Jeff Snider, um dos maiores especialistas no Eurodollar Market, vem nos alertando há anos para o impacto deste mercado nas finanças internacionais, e segundo ele, uma profunda discussão sobre ele se faz necessária.
Para ele, a “Grande Crise Financeira” de 2007/8 foi um “eurodólar event”, nada menos (3). Portanto, para termos tido qualquer progresso nessa temática requereria investigar e verdadeiramente entender esse massivo sistema de moeda off-shore. Ao invés disso, tivemos QEs – Quantitative Easings (afrouxamento monetário), que apenas retardaram a verdadeira solução reais problemas do sistema monetário global.
Pelas advertências que Snider vem fazendo já há anos [ver (4), (5), (6)], pelos seus recentes trabalhos aprofundando o conhecimento sobre o Eurodollar Market (7), pelo reconhecimento de seus pares, e pelas profundas transformações econômicas que temos vivenciado nos últimos anos, nós da Creativante passamos a acreditar na iminência de uma crise financeira muito mais grave do que aquela que atravessamos em 2007/8, e que precisamos urgentemente entender os desafios que certamente devemos enfrentar à frente!
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre os rumos do dólar e o Eurodólar Market na economia mundial, não hesite em nos contatar!
- https://www.thelykeion.com/primer-the-eurodollar-market/
- https://www.cmegroup.com/education/courses/introduction-to-eurodollars/what-is-libor-what-is-eurodollar.html
- https://seekingalpha.com/article/4165066-official-world-moves-little-closer-to-eurodollar
- https://alhambrapartners.com/2013/11/13/understanding-eurodollars-part-1/
- https://alhambrapartners.com/2013/11/15/understanding-eurodollars-part-2/
- https://alhambrapartners.com/2013/11/26/understanding-eurodollars-part-3/
- https://www.realclearmarkets.com/authors/jeffrey_snider/