Se tem um tema dominante nas discussões do mercado financeiro internacional, este tema é o das stablecoins (moedas estáveis). E depois que o GENIUS Act se tornou lei nos EUA, criando o primeiro sistema regulatório federal para stablecoins do mundo, é quase mandatório tratarmos deste assunto. Apesar de já termos mencionado sobre stablecoins em nossa newsletter Stablecoins (Moedas Estáveis), publicado em 08/05/2022, a evolução recente nos impulsiona a voltar a discuti-lo.
Como ressalta Marc Baumann em relatório recente: “As stablecoins cruzaram a fronteira da adoção institucional. O volume transacional atingiu US$ 27,6 trilhões em 2024, superando Visa e Mastercard combinados. A capitalização de mercado atingiu US$ 280 bilhões com analistas projetando US$ 400 bilhões em 2025. Os gigantes da Fortune 500 e as modernas fintechs estão reconstruindo suas infraestruturas para otimizarem capital operacional, cortando custos de transação, possibilitando compensações em tempo real global, e atingindo novos níveis de eficiência operacional e transparência”. Ver Figura 1 à frente.
E para voltarmos a este tão relevante assunto, gostaríamos de apontar para um recente artigo, intitulado “Stablecoins and the Future of Money: Economic Principles and Policy Implications” (Moedas Estáveis e o Futuro da Moeda: Princípios Econômicos e Implicações de Políticas), produzido pelo Prof. Peter Bofinger, da University of Würzburg, na Alemanha, e publicado em julho próximo passado.
O trabalho discute as funções e o potencial das stablecoins como um sistema de pagamentos inovador. O autor faz uma distinção entre bond-based e bank-based stablecoins (stablecoins baseadas em títulos e baseadas em bancos). Bond-based stablecoins têm um modelo de negócio atrativo, oferecendo pagamentos internacionais diretos baseados em um ativo transacional seguro. A dinâmica de mercado revela significativos efeitos de rede, com uma única denominação de moeda, um duopólio de dois emissores, e um limitado número de blockchains. Os emissores dominantes têm demonstrado resiliência durante períodos de choques econômicos.
Os efeitos macroeconômicos de bank-based stablecoins são limitados, uma vez que elas não podem criar empréstimos. No entanto, bond-based stablecoins podem criar moeda ao comprarem títulos governamentais. Enquanto bank-based stablecoins criam riscos de estabilidade financeira ao interconectarem bancos e emissores de stablecoins, bond-based stablecoins não apresentam tal risco. O Digital Euro não é uma alternativa às stablecoins. Seu uso é limitado à área do euro, e ele é desenhado para pagamentos no varejo, e somente permite a posse de ativos por famílias privadas.
O trabalho está subdividido em nove capítulos, e conta com um sumário executivo com doze achados principais, dos quais pinçamos apenas os seguintes. Achado 5: Um dos usos principais das stablecoins é funcionarem como moeda intermediária em exchanges de cripto, servindo também como opção estável para especuladores. Em pagamentos internacionais, o sistema stablecoin tem a vantagem de oferecer pagamentos instantâneos diretos. Isto difere de pagamentos indiretos ofertados pelo sistema SWIFT. Este é baseado em depósitos bancários tradicionais, os quais requerem vários intermediários, já que não há um banco central global facilitando a troca. O potencial de stablecoins para pagamentos no varejo dentro de uma esfera nacional é limitado devido à eficiência dos sistemas de pagamentos indiretos nessa área. Sob condições normais, stablecoins não são consideradas uma reserva de valo devido à proibição de pagar juros. Finalmente, o sistema de stablecoins oferece o potencial para transações anônimas e ilegais. Enquanto wallets (carteiras) de custódia (e.g. Coinbase Wallet ou Binance Wallet) requerem identificação, este não é o caso para wallets não-custodiantes.
Achado 12: Finalmente, para prevenir a emergência de soluções de stablecoins na esfera do varejo, a Europa deve estabelecer uma infraestrutura independente de pagamento no varejo. O European Central Bank – ECB está tentando atingir isso ao desenvolver um novo sistema de pagamento baseado no euro digital. Mas este sistema não apenas terá que competir com estrangeiros, mas também com esquemas de pagamentos nacionalmente estabelecidos. Adicionalmente, contas de euro digital estão somente disponíveis na zona do euro. Em última instância, isso poderia aumentar a fragmentação da paisagem de pagamentos Pan Europeia. Portanto, um enfoque mais prometedor seria integrar os sistemas de pagamentos nacionais de todos os estados membros da União Europeia. Enquanto isso não seja uma tarefa fácil, ela é de qualquer modo a melhor maneira de fortalecer a soberania financeira da Europa.
O estudo acima é rico em detalhes, o que aconselhamos uma leitura mais aprofundada por aqueles mais interessados. De qualquer forma, é mais uma visão, dentre as tantas que estão emergindo, sobre este intrigante ativo que são as stablecoins.
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre stablecoins, não hesite em nos contatar!
Figura 1 – Stablecoins: evolução recente do volume de transações
Fonte: Baumann (2025)