Pouco mais de dez anos depois da Grande Recessão de 2008, os economistas Olivier Blanchard e Larry Summers publicaram, em 2019, o livro intitulado “Evolution or Revolution? Rethinking Macroeconomic Policy after the Great Recession” (Evolução ou Revolução? Repensando a Política Macroeconômica depois da Grande Recessão). Segundo os autores, o foco do livro seria voltado para as três lições principais da última década: a centralidade das Finanças, a natureza mais complexa e problemática das flutuações, e as implicações das taxas de juros muito baixas.

Concentrando nossa atenção na primeira lição, observamos que os autores fizeram o seguinte diagnóstico. Os paradigmas macroeconômicos então prevalecentes largamente ignoraram a possibilidade de considerar desenvolvimentos financeiros como guias de desempenho econômico. Nem a euforia financeira como uma fonte de booms nem crises financeiras como causas de busts desempenharam um papel proeminente no pensamento macroeconômico dos acadêmicos ou policymakers. Nos modelos macroeconômicos, o papel do sistema financeiro foi frequentemente reduzido à determinação da curva de juros e dos preços das ações, baseados em sua maioria na hipótese de expectativas com prêmios de contratos a termo.

Para os autores a crise recente obviamente mudou tudo isso. Ela disparou uma quantidade muito grande de pesquisa nas entranhas e no comportamento do sistema financeiro. No entanto, observam os autores, muitas questões permaneceram sem respostas, e não há ainda um modelo canônico de uma crise financeira.

Conscientes desta lacuna, nos últimos cinco anos, nós da Creativante, bem como do Grupo de Finanças Digitais da UFPE (a partir de 2023), iniciamos uma investigação que procura aplicar o modelo desenvolvido no livro “Effects of IT on Enterprise Architecture, Governance and Growth” aos ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais, numa tentativa de contribuir para esta discussão a partir de um arcabouço analítico próprio.

Partimos de algumas hipóteses de trabalho. Primeiramente, assumimos, à semelhança do que o investidor Marc Andreessen escreveu em 2011 (que “Why Software Is Eating The World”), que “Digital is Eating Finance”, ou seja, que a dimensão digital da vida econômica está dominando a dimensão financeira. E, em segundo lugar, que para entendermos essa “hegemonia” digital nós precisamos nos valer de alguns conceitos fundamentais da nova economia digital, tais como plataformas, ecossistemas, arquiteturas e governanças.

Sendo assim, para trabalharmos com o modelo Arquitetura-Governança-Crescimento do livro acima citado, consideramos ser necessário adotar como unidade básica de análise o conceito de ecossistema de negócios, em contraste com o foco na empresa originário do livro referido. Desta forma, buscamos identificar (no primeiro vídeo publicado pelo Grupo de Finanças Digitais da UFPE publicado em 02/06/2023) um arcabouço analítico para a governança de ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais, seguido (pelo segundo vídeo em 22-06-2023) por um arcabouço de arquitetura de ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais, e, finalmente, tratamos do crescimento/escalagem de ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais (no vídeo publicado em 25-07-2024).

Apesar de termos identificado as três dimensões dos ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais, faltava-nos identificação de um paradigma macroeconômico que nos possibilitasse considerar desenvolvimentos financeiros como guias de desempenho econômico. E foi assim que chegamos à identificação, de um lado, de um arcabouço de Macrofinança, e de outro lado de um arcabouço de Liquidez Global.

O arcabouço da Macrofinança é aquele que vem sendo sugerido pelo Prof. Markus Brunnermeier, da Princeton University (EUA), sistematizado na Figura 1 à frente. Já tratamos de temas propostos pelo Prof. Brunnermeier aqui nas newsletters Macrofinanças e Resiliência, Safe Assets (Ativos Seguros) (Parte 1), Safe Assets (Ativos Seguros) (Parte 2), Safe Assets (Ativos Seguros) (Parte 3-Final), e A Crash Course on Crises (Um Curso Intensivo Sobre Crises), e nossa proposta de paradigma macroeconômico introduz dimensão das finanças digitais no modelo da Figura 1, tal como representado na Figura 2 à frente.

A introdução das finanças digitais da Figura 2 procura espelhar o foco do Grupo de Finanças Digitais da UFPE, que tenta analisar a convergência de três ecossistemas financeiros baseados em plataformas digitais: o CeFi – Centralized Finance, o DeFi – Decentralized Finance, e o PlatFi – Platform Finance, como mostra a Figura 3 à frente.

Finalmente, identificamos um arcabouço inovador que trata sobre Liquidez Global. Este arcabouço foi desenvolvido pelo economista Michael Howell, autor do livro “Capital Wars: The Rise of Global Liquidity”, que resenhamos na newsletter Capital Wars: The Rise of Global Liquidity (Guerras do Capital: O Surgimento da Liquidez Global). O arcabouço do Michael Howell parte de uma arquitetura do sistema financeiro mundial como ilustrado na Figura 4 à frente.

Na próxima newsletter vamos tratar um pouco mais a relevância deste arcabouço sugerido pelo Michael Howell, e apontar como ele é relevante para o tratamento da dimensão das Finanças Digitais.

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre novas arquiteturas do sistema financeiro internacional, não hesite em nos contatar!

Figura 1 – MacroFinança

Ilustração mostrando a interseção da macroeconomia com finanças

Fonte: Brunnermeier (2024)

Figura 2 – MacroFinance and Digital Finance

Ilustração mostrando a interseção da macroeconomia com finanças e finanças digitais

Fonte: Brunnermeier (2024) elaborado

Figura 3 – Digital Finance Ecosystems

Intercessão do ecossistema de finanças digitais

Fonte: Grupo de Finanças Digitais da UFPE (2023)

Figura 4 – Sistema Financeiro Mundial

Ilustração representativa do sistema financeiro mundial

Fonte: Howell (2025)